sexta-feira, dezembro 26, 2008

Talvez XIV

Talvez haja em Chelas um coleccionador de nuvens

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sábado, dezembro 20, 2008

Não Tenho Jantar de Natal da Empresa

Não tenho jantar de Natal da empresa;
não tenho pão, broa, vinho nem bacalhau sobre a mesa.
Também não tenho patrão que aponte um dia da minha agenda
para ter mesmo a certeza
de que pode mesmo dispor da minha agenda.

Não tenho jantar de Natal da empresa,
nem toalha sobre a mesa;
tenho casa de solteiro desarrumada e estou a jantar n' O Cisne
- por ironia, solitário, com vontade de viver intensamente, mas longe disto;
de devorar a espetada de lulas mista como se amanhã não houvesse marisco.

Não tenho jantar de Natal da empresa;
não tenho a alegria disfarçada de uma boa refeição grátis;
não tenho uma colega que ri de tudo o que eu diga,
entre tragos de vinho branco com Seven Up
e gargalhadas de Ah's abertos e dores de barriga.
Não tenho um colega que freneticamente digita
mensagens para o telemóvel da amiga.

"Vou chegar um bocadinho atrasado. Fica mal sair tão cedo. Posso ficar até às 2h, senão ela desconfia. O Carlos e o Rui vão beber um copo às Docas. Digo que fui com eles. Não há espiga."

Não tenho jantar de Natal da empresa
e quando tive fui sempre desamparado,
com algo que em mim vazio ecoava
como numa secular igreja.

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terça-feira, dezembro 16, 2008

Baby Jane "tocam" meia música na RTP1

Quase em simultâneo com a página oficial dos Baby Jane, o Caderno de Corda mostra como foram aqueles quase três minutos televisionados do final de manhã do dia 15 de Novembro passado, quando a banda apresentou em playback, no programa Portugal Sem Fronteiras, da RTP1, uma versão encurtada de "História de Um Vinho Azedo". Keep on rockin'.

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segunda-feira, dezembro 15, 2008

Prémio Este Blog Vicia

O Caderno de Corda recebeu há largo tempo, do Rato do Deserto, a distinção inter-bloggers "Este Blog Vicia". É algo bom de receber, mas difícil de retribuir. Ou falta alguém ou fomos tendenciosos e porreiristas. Com vénia ao meu querido amigo Trigo, a quem retribuo igualmente o prémio, quero, antes da atribuição, fazer uma pequena consideração: dado que este é o prémio dos blogues que viciam, opto pelo critério simples de escolha de blogues que, essencialmente por afinidade com os autores (mas não apenas!), visitarei sempre, uma e outra vez. Assim, escolho os seguintes:

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sexta-feira, dezembro 12, 2008

Gogol Bordello in your face



O Caderno de Corda não resiste ao apelo dos estimados leitores e, em resposta à Alminha Mariana, lança uma pequena nota sobre o concerto dos Gogol Bordello no Campo Pequeno, quarta-feira passada, além de um vídeo razoável e outro muito bera - este captado por mim -, certamente lamentável de ouvir. Aliás, foi porque o som da minha captação era de tal modo excruciante que quase não publicava sequer palavra sobre o assunto. Assim sendo, aqui vai disto, sem muitas considerações.

Quando olhamos para a frenética trupe liderada pelo ucraniano Eugene Hütz, pensamos eventualmente como é que um número razoável de cromos daquele calibre foram todos parar à mesma banda, ou como serão os camarins; os despojos de tournée.

Durante hora e meia, o gypsy punk dos Gogol Bordello tomou de assalto, olhos nos olhos, uma plateia jovem e energizada pelo furacão de Leste nova iorquino com kick punk, num rodopio doidivanas e anarquista que encheu um palco simples, onde se ostentava apenas, atrás da bateria, o logo da banda.

O aracnídeo Hütz, por vezes fazendo lembrar uma personagem cómica de banda desenhada, desde logo empunhou uma garrafa de vinho, saudando o público. Com altíssima e constante intensidade, toda a banda chegava frequentemente junto do público e creio que Hütz, ao performar o velho número rock-chunga de apanhar a cuspidela para o ar, terá mesmo falhado a recepção com a boca e acertado em cheio na fila da frente.

No final, Hütz percutiu sem dó nem piedade um balde vermelho já bastante mal tratado dentro do qual estava o microfone. O último acorde da noite soou em sincronia com o estrondo do utensílio cilíndrico e do microfone baqueantes no chão, depois de atirados num gesto largo para o alto.

In your face, este concerto dos Gogol pode não ter sido o melhor do ano - a bem da agenda nacional de concertos -, mas foi decerto um dos de mais alta rotação. O defeito: ao final de dez músicas temos a sensação que o disco virou e toca o mesmo. Mas a energia está lá.

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quarta-feira, dezembro 10, 2008

Hoje, dentro de instantes...

Gogol Bordello,

o espectáculo mais alucinante do ano. No Campo Pequeno e à borliú. Foto DAQUI

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terça-feira, dezembro 09, 2008

Porque decepei o meu campo de girassóis

Numa colmeia de província havia uma abelha vulgaríssima, aparentada de vespas e zangões desambiguados. Prima de formiga - chamemos-lhe Maia, se bem que o nome a exceda em simpatia -, a apis mellifera Maia procurava flores rubras, quando é sabido que toda e qualquer comum abelha poliniza especialmente flores descoloridas e pardacentas - salvo excepções justificadas.
Tinha cinco olhos a abelha Maia - três pequenos no cocuruto e dois compostos e esbugalhados à frente. Era desconfiada - logo, também merecedora de pouca confiança. Incrivelmente, a lígula competia em comprimento com uma protuberância adunca, ligeiramente abaixo dos dois olhos esbugalhados, a meio, a fazer lembrar um nariz - que, como o estimado leitor saberá, não compõe a anatomia das abelhas. Ainda que não pudesse ser rainha, a operária Maia orgulhava-se da invulgar protuberância e até de partilhar os mais vis defeitos de espírito das abelhas vulgares - que os têem!, mesmo que todos inestéticos, os defeitos -, mas a verdade é que a presunção lhe dava um estranho élan.
Maia vinha ao quintal da minha casa diariamente. Como as abelhas vulgares, fazia, em média, 40 voos por dia, visitando dez flores por minuto. Não sei se a vi entre tantas abelhas dessas, vulgares, que sobrevoam numa névoa o colmeal, passando as aventureiras para cá da sebe, mas assim suponho. Por vezes, pareciam zunir à porta de casa. É possível. Nunca então abri a porta. Mas, em tantas oportunidades, nenhuma alguma vez me ferrara o espigão, tão doce era o pólen e o néctar dos meus girassóis. Julgava que as abelhas me respeitavam pelos girassóis, mesmo a mais vulgarzinha delas - e, na colmeia, eram mais de 80 mil as congéneres daquela abelha ordinária a que chamámos Maia.
Certa noite amena, saí até ao alpendre enquanto bebia café. Observava o céu estrelado e notei um zumbido que parecia comandar a maviosa orquestra do nocturno fundo sereno. Deixei-me ficar mais um pouco, entre o aroma doce do café e a acalmia apaziguante do momento.
Voava Maia de flor para flor, de estrela para estrela, atarefada, sem tempo para a tristeza, quando me terá pressentido, a escassos metros dos primeiros girassóis. Sem resignar-se à climatização perfeitamente disciplinada da colmeia, com o sacrifício dos que fecundam no azul e morrem, aquela abelha mesquinha achou-me inimigo e apontou o ferrão ao meu nariz, no qual injectou furiosamente o seu veneno acre. Como se tivesse sentido um choque eléctrico de alta voltagem que pelas narinas me percorreu o crânio, pude apenas vê-la quedar-se um segundo sobre o meu nariz, olhando-me corajosamente com aquelas ventas de abelha odiosa, salientadas pelo seu próprio quase-nariz, tão invulgar nas abelhas. Espalhei o café sobre a roupa e rasguei o suave som do silêncio com um grito lancinante. Em fuga, a operária Maia voou também ela atordoada, depois de deixar parte do intestino agarrado ao ferrão, que prontamente retirei da ponta do meu nariz com a ajuda de uma moeda.
Sabia que Maia morreria um ou dois dias depois; sabia que à vingança nem sempre segue o arrependimento. Assim, pelos louvores da virtude, porque a verdadeira vingança é doce como o mel para o escol das abelhas, decepei todos os girassóis na manhã do dia seguinte, desfigurado ainda. Qual Calimero, chorei pelos girassóis durante um mês e meio - o tempo médio de vida de uma abelha operária -, mas não mais fui incomodado por abelhas dispostas a perder a própria vida por um impulso de maldade.

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sexta-feira, dezembro 05, 2008

Escrito em 1802...

"I believe that banking institutions are more dangerous to our liberties than standing armies. If the american people ever allow private banks to control the issue of their currency, first by inflation, then by deflation, the banks and corporations that will grow up around the banks will deprive the people of all property until their children wake up homeless on the continent their fathers conquered."

Thomas Jefferson, 1802

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quinta-feira, dezembro 04, 2008

quarta-feira, dezembro 03, 2008

Engenho de Ida

Na era espacial era uma vez um velho avião com combustível
que voava quando todas as naves estavam desmanteladas em terra
a aguardar por mais mil anos de ciência.

Depois da Grande Depressão a paz absoluta reinava
sob um manto nu de homens desmamados,
recurvados junto às poças da catástrofe tecnológica.

Havia uma mulher que receava embarcar nesse avião
para onde os lagos eram translúcidos,
porque o remendo com asas podia despenhar-se.

Havia um homem que sonhara toda a vida
com lagos translúcidos e rios truteiros
na outra ponta distante da rota.

O combustível do avião era o bastante para a viagem de ida.

A mulher tinha receio da morte...
da morte!, imagine-se...
Sobrevivia, é verdade.
O paliativo com asas não impressionava
nem dava garantia de nada - sequer de chegada!

Já o homem vivia...
Tinha um sonho de orvalho lá fora e calor na cama;
de manhãs de sol com cheiro a terra
junto a lagos translúcidos e almoços grelhados
de trutas e batatas cozidas em água do poço.

(Sem sonho o homem morre, e a morte é a coisa mais certa)

Nas ruínas da periferia descobriram ambos o descampado.
A pista estava livre. Os pilotos esperavam pela conta de 325.
A bagagem era muita - utensílios vários, inestimáveis no desconhecido.
Os passageiros acorriam ao local. A notícia alastrava-se.

Ela advertiu-se de que, algures, alguém tinha como recuperar a civilização.
Soube, nesse instante, que não embarcaria num patético avião.
Já sem medo da morte, que julgava evitar assim,
evitou a vida.

Ele não teve outra saída senão entrar,
que a morte é a coisa mais certa
mesmo quando não se evita viver.

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Na Ucrânia, mas DAQUI

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