terça-feira, maio 21, 2013

Foto DAQUI, com referência a ESTE poema dedicado a Ray Manzarek no dia da sua morte

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Luz Branca Cega

Eu quero estar lá,
onde a luz branca cega
e ergue cidades;
em local indefinido,
sem corpo,
tão amplo e tão esconso,
sólido e ténue, que só assim
sustenha a iniquidade erma
de uma palestiniana
e todas as coisas
que no cérebro encerramos
sem sabermos adormecer o universo.
Eu quero estar lá,
reflexo da luz branca
que extinguiu em cinzas,
num caixão selado,
o coração exausto do meu Irmão,
sem credenciais necessárias.
Quero estar na fronteira,
onde a luz branca cega
não permita distinguir
quem seja amigo
por não existir inimizade
e o caminho se faça
segredado por um ribeiro
sem que restem dúvidas
nem destino.
Quero estar lá,
banhado pela luz cega
que evolve continentes
para lá da compreensão;
na carreira das ondas
até à espuma da Lua,
maré de esperança a nado.
Quero estar nessa manhã de luz branca
sem entardecer
para regressar à condição
de matéria sem memória.

Todos temos os nossos cães atropelados
e a pálida hora de negarmos quem somos
por não o sabermos nunca.
Quero estar lá, a memorar a morte,
para que a não confunda com a vida
e possa reconhecer as chaves do reino
em que me encontre e saiba ter renascido.
Quero estar lá, infinito,
numa viagem de luz e sangue
navegado pela ignorância de Colombo.
Cega e branca, a luz ofusca os magos
e deixa morrer o vinho na videira,
mas dá-nos asas no lugar de ombros
- macios como dorsos de corvos
engalanados em festim de família.
Quero estar na noite diurna do tempo
não sabendo em que fuso horário 
deva converter sonhos de divindade,
numa praia em que casais nus de amantes
passeiem à beira-mar e sorriam.
Quero estar lá, sem corpos macios
nem ascendência polaca, nem luz branca,
a pairar sobre a consciência descalça,
como quem pede minutos ao despertador.
Não sei se agradeça pela luz branca cega.
O cálculo da razão planeia homicídios
e funda religiões atrás de vedações.
Quero estar lá para um último beijo
antes que nos reencontremos.
Eu hei-de estar lá.

Obrigado, Ray Manzarek (12 de Fevereiro de 1939 - 20 de Maio de 2013)

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sexta-feira, maio 17, 2013

Videoclip de "Mãe"


A canção "Mãe" foi recentemente apresentada AQUI, no Caderno de Corda, mais precisamente no dia 5 de Maio de 2013. Hoje publico o videoclip possível, realizado por mim, pejadinho de imagens ilicitamente obtidas do YouTube. Não deixo, no entanto, de referir as fontes  de que me abeberei, "com todo o respeito":

- http://www.youtube.com/watch?v=gaK0VPV9NlE
- http://www.youtube.com/watch?v=mVutXcycUjQ
- http://www.youtube.com/watch?v=7GGzc3x9WJU
- http://www.youtube.com/watch?v=-2IElTsBsMo
- http://www.youtube.com/watch?v=pV58YptFTK0
- http://www.youtube.com/watch?v=ZhgR3zVfo-0
- http://www.youtube.com/watch?v=w1TQrc_UE7A
- http://www.youtube.com/watch?v=-xgZZPByb1A&NR=1&feature=fvwp
- http://www.youtube.com/watch?v=GdFRB7D53Do
- http://www.youtube.com/watch?v=RiGeqsGjhoY
- http://www.youtube.com/watch?v=Un5SEJ8MyPc
- http://www.youtube.com/watch?v=EIxAPFYDsnQ
- http://www.youtube.com/watch?v=0lMXAOc4FQA
- http://www.youtube.com/watch?v=Cd9cBlvfjow
- http://www.youtube.com/watch?v=AoisqOGQIVE
- http://www.youtube.com/watch?v=-VFe0DG7LDE

Devo acrescentar que o videoclip que aqui se estreia foi realizado por mim em software gratuito. Compus e gravei integralmente a música em casa (música, letra, baixo, guitarras, vozes), à excepção da bateria, gravada e tocada por Sebastiano Ferranti, que, por fim, misturou e masterizou a canção. Todas as informações no post de lançamento da canção.

n. b. - Porque a audição da música é prejudicada pela má qualidade do som pós-upload no YouTube, segue abaixo um player que remete para a mesma, com melhor qualidade de audição, embora num MP3 fraco, é certo. Se o estimado leitor quiser pode, em local apropriado, e sem procurar muito, fazer o download desta e doutras canções.
 

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domingo, maio 05, 2013

Nova canção 'Mãe' em estreia aqui e agora no dia da... mãe


'Mãe' é uma canção que deu o primeiro ar de graça no final do Verão de 2011, estava eu na minha anterior casa a trabalhar numa publicação que dirijo com o designer meu Amigo Luís Dias - ele estava a fazer paginação e eu a tocar guitarra enquanto o observava, mais precisamente. Foi assim que surgiram os primeiros acordes, que retive porque capturei o momento em vídeo, com o telemóvel, para eventualmente retomar o projecto de canção mais tarde. Muito tempo depois, quando acabei de gravar 'Liberdade É Escrever Canções', recorri às gravações que tenho de esboços de canções, feitas com recurso a telemóveis, computador, gravador e leitor de MP3 ou, claro, ao Boss Micro BR, e encontrei o tal registo em vídeo de quando estava sentado junto ao Luís a arranhar aquela primeira sequência de acordes em SI. De entre muitas gravações de ideias e esboços, engracei com aquilo naquele momento e peguei-lhe para fazer o que acabou por ser esta canção.  
Mais de um ano após o surgimento da primeira ideia, já quando formada uma estrutura básica, e enquanto eu procurava uma melodia para a voz, afigurou-se uma única palavra para o refrão: Mãe. A letra, por seu turno, teve a sua primeira versão escrita no Verão de 2012, passado quase todo à beira da piscina de um Irmão, mas só foi fechada em Fevereiro de 2013.
Essencial neste caso é referir que, desta vez, tive a colaboração indispensável e muito prezada do meu dear and old chap Sebastiano Ziani de Ferranti (Bill, ex-Three and a Quarter actualmente nos Youthless), que já se tinha predisposto por diversas vezes para ajudar no que fosse preciso, muito especialmente no que à gravação diz respeito. Acontece que 'Mãe' não poderia mesmo ser gravada inteiramente no meu gravador de quatro pistas Micro BR, uma vez que os padrões de bateria que o Micro BR apresenta não seriam adequados às especificidades desta canção em particular. Nem um ritmo do Micro BR se aproveitava... Por isso, falei com o Bill para que ele gravasse a bateria na velha cave/sala de ensaio dos Ferranti. O Bill gravou a bateria e acertou-se ali que esta canção seria gravada, misturada e masterizada por ele.
No entanto, por saudável divergência de métodos, e após algumas sessões infrutíferas de gravação de cordas na casa do Bill de então, na Graça, nas quais gravámos ainda o órgão com um controlador midi, acabámos por concluir que seria mais proveitoso e menos cansativo para ambos se eu gravasse o baixo e as guitarras em casa, com o Micro BR de sempre. O Bill ainda gravou ali o baixo que serviu de guia, mas, em minha casa, com o meu baixo Rockson de 80 euros, acabei por gravar a linha de baixo definitiva. Posto isto, avancei também com as guitarras em casa, mas senti, mais uma vez, que o processamento do Micro BR é por vezes curto ou insuficiente - não tanto em diversidade, mas quanto à qualidade de som de alguns presets. As guitarras usadas foram a electro-acústica Ibañez EWC-30 de cordas de aço e a eléctrica Duesenberg Starplayer TV. As pistas foram depois misturadas na actual casa do Bill, em Ranholas, com recurso ao software ProTools. O resultado disto e da masterização decorrente foi obtido após o trabalho possível nos tempos livres raros de que o Bill dispôs, especialmente encurtados com a recente paternidade da pequena Jasmin Ferranti. De referir que, em prazo indefinido, 'Mãe' terá mais duas versões de remistura e remasterização - uma segundo a interpretação do Bill e outra mais de acordo com o meu parecer.
Por capricho do calendário, a canção ficou pronta no passado dia 1 de Maio, a quatro dias deste dia 5, que não por acaso é o dia da mãe. Por isso a guardei para apresentação hoje, dia em que tenciono oferecê-la à minha mãe num CD. Apesar destes factos, esta não é uma canção de dia da mãe e muito menos um tema de alegre exaltação à progenitora ou a uma qualquer efeméride que daí decorra. Em boa verdade, esta é uma canção que, perante medos, desesperanças, sofrimentos e solidões, clama pela mãe - a mãe de todas as mães, chamem-lhe, porventura, Eterno Feminino. 
"Eterno Feminino" terão sido as últimas pa­lavras de Goethe, no segundo Fausto, para designar a atracção que guia o desejo transcendente do homem. Curioso que eu tenha utilizado, na letra, ideias e palavras de Fausto (o Bordalo Dias), mas também de Jorge Palma e, muito especialmente, de José Mário Branco, mas já lá vamos. Na ideia referida de Goethe, o feminino representa o desejo sublimado, e isso é proclamado por um coro místico: "O Eterno Feminino nos atrai para o Alto." Em muitas cogitações filosóficas, antropológicas ou místicas a mulher está mais li­gada do que o homem à alma do mundo, às primeiras forças elementares, e é através dela que o homem comunga dessas forças, mas não será a mulher emancipada nem aquela que se tornar semelhante ao homem a que terá um importante papel a desempenhar no período futuro da história, mas sim o chamado "Eter­no Feminino", que encontra no Amor a grande força cósmica. A Virgem-Mãe, Nossa Senhora, é a encarnação mais evidente do tema. O Feminino autên­tico e puro é, por excelência, uma energia luminosa e casta, portadora de coragem, de ideal e de bondade a que recorremos em oração e, por vezes, em desespero de causa, clamando pela mãe. Por vezes também se escrevem canções nesse mesmo estado de espírito... Para Jung, o feminino personifica as tendências psicológicas femininas na psique do homem, como, por exemplo, senti­mentos e humores instáveis, intuições proféticas, a sensibilidade ao irracional, a capacidade de amar, a faculdade de sentir a natureza e, finalmente, as relações com o inconsciente. 
Se foi nisto que o Jorge Palma pensou quando escreveu, por exemplo, o refrão da 'Canção de Lisboa', ou o Fausto, quando redigiu  o poema da canção 'Ó Mar', que obviamente inspira a segunda e a terceira estrofes, não faço ideia, mas é certo que o José Mário Branco tocou a ferida universal quando fez descambar um pranto doloroso à mãe já na parte final da épica canção 'FMI', à qual roubei palavras que adaptei para a última estrofe e último refrão da minha canção 'Mãe'.
Todas as canções originais deste player estão disponíveis para download gratuito.
Clique em "download".

* Mãe - letra *
Meto à boca o pão,
seco, duro como pedra, amor
que não me deste a...
beber do teu suor
o sal da vida salga
a ferida eterna e universal
Sou mais do que animal,
mais que a fera parida
- Mãe -
O que o tempo esqueceu
leva que hei-de voltar ao mar
profundo de um sono meu
Eu sou como quem vem
desamparado pra regressar
ao fundo ventre da mãe
Sou mais do que animal,
mais que a fera parida
- Mãe -
Sou algo que é só meu,
faço comigo o que quiser
Desde que haja amor?
- Amor não dá de comer!
Não posso desnascer,
ir embora sem ter de ir embora,
sou deste tempo
entre fugir de me encontrar
e me encontrar fugindo
- Mãe -

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